O ultimo ano em que a Roma foi potência

Como todos viram ontem, a Roma tomou um chocolate do Barcelona por 6×1, jogou muito mal e foi criticada pela imprensa italiana, ultimamente a Roma vêm figurando entre os times médios do continente, mas nem sempre foi assim. Em 2001 a Roma montaria um super esquadrão que conquistaria o Scudetto daquela temporada.

Quando o século XX terminou, os torcedores da AS Roma não tiveram muito que comemorar. O clube da capital italiana não vencia um grande título há 18 anos, a rival Lazio tinha acabado de levantar o Scudetto e a cidade eterna ganhava como cores predominantes o azul-celeste e o branco. Mas, na primeira temporada do século XXI, novos ares arejaram o Coliseu e o imponente estádio Olímpico. Era hora de a turmaGiallorossi voltar a sorrir. Vibrar. Cantar a plenos pulmões. E, assim como nos anos 80, ter mais um maestro no meio de campo para amar e adorar. Com argentinos, brasileiros, franceses e um filho pródigo bem italiano e legítimo cavaleiro romano, Francesco Totti, a Roma não deixou a torcida da Lazio celebrar por muito tempo e conquistou, na temporada 2000-2001, seu terceiro título nacional de maneira incontestável e inesquecível. Com um futebol eficiente, equilibrado e legitimamente competitivo como manda o script do técnico Fabio Capello, a equipe trucidou os rivais e repintou a capital italiana com o grená e o amarelo que temperaram os mais diversos gramados do Calcio. Foi uma das maiores festas já vistas na Itália e mais de um milhão de torcedores lotaram o Circo Massimo, muito mais gente do que a própria Seleção Italiana levou às ruas após o título mundial de 2006, uma façanha que só a Roma consegue proporcionar. Afinal, quando a equipe da loba vence, é com estilo e com pompa. É hora de relembrar.

 Há mais de uma década enfrentando um incômodo jejum, a Roma teve seu orgulho ferido quando a rival Lazio começou a montar um esquadrão cheio de craques no final do século XX. Graças ao dinheiro de Sergio Cragnotti, o time celeste reuniu estrelas como Nesta, Mihajlovic, Stankovic, Simeone, Verón, Roberto Mancini, Nedved, Salas, Vieri e Crespo e conquistou títulos inéditos e históricos. Teve Recopa da UEFA, Supercopa da UEFA, Supercopas da Itália, Copas da Itália e um Campeonato Italiano, este na temporada 1999-2000. Ver o maior rival levantar taças a rodo e ficar de mãos abanando foi a gota d´agua para os romanistas, em especial para o presidente Franco Sensi, que não titubeou em fazer da temporada seguinte ao Scudetto da Lazio a derradeira para sua querida Roma voltar a sorrir.

Com algumas semanas de treinamento, Fabio Capello deu uma nova cara à Roma e deixou os torcedores com grandes perspectivas. Com os reforços para a zaga, o treinador armou sua equipe com três zagueiros e deu mais liberdade para Cafu e Candela atacarem. No meio de campo, Zanetti, Emerson e Tommasi se revezariam entre os titulares e teriam como principal função a marcação, mas sem restrições para eventuais subidas ao ataque. Falando em ataque, Totti seria o grande maestro que possibilitou a Capello transformar o esquema tático da equipe num 3-4-1-2, uma variação do clássico 3-5-2. O camisa 10 seria o garçom de Montella, Delvecchio e Batistuta, e também teria liberdade para marcar gols e mais gols. Era apenas uma questão de tempo para a tática virar prática e funcional, dando ao time um fluxo de jogo muito bom e com grandes variações ofensivas, bem como uma notável segurança defensiva. Os rivais teriam que rever conceitos e se preocupar. A loba estava de volta.

Crise e superação

Antes mesmo de o Campeonato Italiano começar, a Roma levou um susto que quase custou o planejamento da temporada inteira. Em setembro, pela Copa da Itália, a equipe levou de 4 a 2 da modesta Atalanta e foi eliminada precocemente da competição, fato que gerou uma revolta imensa na torcida, que foi tirar satisfação com os jogadores e chegou até a dar pontapés nos carros de alguns atletas romanistas. O clima tenso só seria amenizado com um bom início no torneio nacional, bem como na Copa da UEFA. E foi exatamente isso que a equipe da loba fez. Nas três primeiras rodadas do Calcio, vitórias sobre Bologna (2 a 1, gols de Totti e Castellini, contra), Lecce (4 a 0, com dois gols de Batistuta, um de Tommasi e um de Totti), e Vicenza (3 a 1, gols de Totti, Montella e Batistuta). Na Copa da UEFA, a equipe despachou o HIT Gorica, da Eslovênia, com um acapachante 11 a 1 no placar agregado, além de eliminar os portugueses do Boa Vista na fase seguinte, com vitória por 1 a 0 fora de casa e empate em 1 a 1 em casa.

A Roma, chegou à ultima rodada liderando por dois pontos na frente da Juventus, então comandada por Carlo Ancelotti: 72 a 70. A arquirrival Lazio tinha 69 pontos, com chances remotas (precisaria ganhar e torcer para a Roma perder e a Juve ao menos empatar). O jogo chave havia sido no começo de maio, um 2×2 heróico em Turim com a Roma saindo perdendo por 2×0.

Roma, campeã italiana em 2001 Reprodução capa Gazzetta dello Sport
Roma, campeã italiana em 2001 Reprodução capa Gazzetta dello Sport

Era uma temporada mágica para os giallorossos, com contratações de muito impacto gerando a espinha dorsal do time, em todos os setores : o zagueiro Walter Samuel (Boca Juniors), o meia Émerson (Bayer Leverkusen) e anida matador Gabriel Batistuta(Fiorentina) . O time-base foi (3-5-2, um dos melhores que eu vi): Francesco Antonioli; Antônio Carlos, Walter Samuel e Jonathan Zebina; Cafu, Émerson, Damiano Tommasi e Vincent Candela; Francesco Totti; Vincenzo Montella e Gabriel Batistuta. Como reservas importantes: Aldair, Marcos Assunção, Cristian Zanetti, Hidetoshi Nakata, Marco Delvecchio, Abel Balbo.

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A base da Roma campeã italiana equilíbrio ofensivo e defensivo dava ao time enorme poder de decisão

Na rodada final, a Juventus virou sobre a Atalanta por 2×1, enquanto a Lazio levou 2×1 do Lecce fora. Porém isto nada significou já que a Roma passeava sobre o Parma no Olímpico (jogo completo): Francesco Totti aos 19, Vincenzo Montella aos 39 e Gabriel Batistuta aos 33 do segundo tempo (Marco Di Vaio descontou pros visitantes aos 37 do segundo tempo).  Fim do jejum de 18 anos sem títulos.

Veja como foi o jogo:

Os personagens:

Antonioli: não foi uma unanimidade na posição, mas deu conta do recado durante a temporada. Podia fazer grandes partidas e cometer erros grotescos, como nos tempos em que defendeu o Milan, nos anos 90. Após quase cinco anos na Roma, Antonioli foi jogar na Sampdoria, em 2003.

Lupatelli: com boa estatura, o goleiro disputou algumas partidas na temporada e foi uma das opções de Capello para o setor mais frágil daquela Roma. Jogou na equipe de 1999 até 2004.

Zebina: com boa presença de área, força e raça, o francês caiu nas graças da torcida e virou titular absoluto do esquema tático de Capello. Fez um ótimo Campeonato na temporada 2000-2001 e mostrou muita segurança nas jogadas aéreas e até como falso lateral-direito para cobrir os espaços deixados por Cafu. Após sua passagem pela Roma, foi jogar na Juventus.

Samuel: depois de brilhar no Boca Juniors campeão da Copa Libertadores de 2000, o argentino vestiu com maestria a camisa da Roma e mostrou porque era um dos mais talentosos zagueiros da época. Com segurança nas jogadas pelo chão e pelo alto, ótimas antecipações, boa impulsão e força nos desarmes, Samuel foi titular da zaga romana e brilhou intensamente na equipe entre 2000 e 2004.

Antônio Carlos Zago: com fama no São Paulo e no Palmeiras, o brasileiro esbanjou segurança na zaga romana e foi uma das peças fundamentais do coeso esquema tático da loba. Sem brincar em serviço e jogando para o time, Zago fez um ótimo campeonato e ganhou muitos elogios da torcida e imprensa.

Aldair: veterano, o zagueiro viveu seus últimos momentos de glória com a camisa da Roma na temporada 2000-2001. Já sem a vitalidade de antes, Aldair jogou bem menos do que nos anos anteriores, mas cumpriu seu papel com a regularidade de sempre e o futebol discreto, mas muito eficiente. Mito em Roma, o defensor disputou 435 jogos entre 1990 e 2003 na loba e teve até sua camisa, a de número 6, aposentada, além de ter sido incluído no Hall da Fama do clube por seus serviços prestados em mais de uma década.

Cafu: veloz como sempre e com o fôlego nas alturas, Cafu ganhou o coração da torcida romana e foi um dos principais jogadores da equipe entre 1997 e 2003. Com cruzamentos, passes precisos, intensa presença no ataque e sem grandes obrigações defensivas no esquema 3-5-2, o lateral deitou e rolou na temporada 2000-2001 e ajudou a Roma na conquista do título nacional, bem como nas construções de jogadas de ataque. Depois de tanto brilho, foi jogar no Milan, onde encerrou a carreira, em 2008.

Tomassi: foi uma das grandes revelações da Roma naquela conquista e essencial para a parte tática do time. Polivalente e com grande visão, o meio-campista teve enorme importância na parte coletiva, na marcação e até nos ataques, chegando a marcar vários gols. Suas atuações o levaram para a Seleção Italiana. Jogou durante uma década na loba e virou ídolo da torcida.

Marcos Assunção: com uma precisão impressionante nas bolas paradas, o brasileiro foi outro que se destacou mesmo não sendo titular. Quando entrava, Assunção criava mais chances de gol com seus lançamentos e criava ele mesmo os gols se aparecia alguma falta perto da área adversária.

Cristiano Zanetti: foi o grande cão de guarda do meio de campo e deu muita qualidade ao setor com passes precisos, bom controle de bola e eficiência. Formou uma dupla inesquecível ao lado de Tommasi e jogou de 1999 até 2001 na equipe da capital.

Emerson: fechava a legião de bons brasileiros da Roma e dava ao técnico Capello opções extras para o meio de campo quando necessário. Quase um 12º jogador, Emerson esbanjou categoria, força física e bons lançamentos, além de marcar gols importantes na temporada. Em 2002, seria o capitão da Seleção Brasileira na Copa, mas se lesionou em uma brincadeira e deu lugar ao também romanista Cafu.

Guigou: o uruguaio chegou após boas temporadas no Nacional, mas não teve grandes chances no time titular por causa da forte concorrência. Mesmo assim, teve alguns bons momentos e não comprometeu.

Totti: toques precisos e envolventes, dribles pontuais, precisão cirúrgica em bolas paradas, instinto artilheiro, chutes potentes e certeiros, e a raça de um verdadeiro gladiador. Essas são algumas das características que fizeram Francesco Totti, um romano na alma, no sangue e na carne, ganhar em tão pouco tempo a camisa 10, a braçadeira de capitão e o coração de todo e qualquer torcedor da Roma. Com ele em campo, a loba foi campeã italiana depois de 18 anos e voltou a ter identidade e respeito como há tempos não tinha. Craque maiúsculo e nascido para vestir o manto grená, o craque foi o principal destaque do time naquela era de ouro e se tornou o maior jogador da Itália na época. Embora tenha decepcionado na Copa de 2002, o meia deu a volta por cima em 2006, e conquistou o Mundial com a Azzurra. Um craque imortal que terá lugar aqui no blog assim que se aposentar – algo que o torcedor romano torce para que não ocorra tão cedo.

Candela: o lateral francês pode não ter tido grandes chances na seleção, mas na Roma ele foi titular absoluto e fundamental para o título de 2001. Eficiente no apoio ao ataque e também na marcação, Candela foi muito bem e jogou de 1997 até 2005 na equipe da capital.

Batistuta: muitos o criticaram quando ele deixou a Fiorentina para jogar na Roma, mas Batigol fez valer cada centavo gasto pela diretoria romana com o que ele mais gostava e sabia fazer: gols. Foram 20 só no Campeonato de 2000-2001, desempenho que ajudou a equipe da loba a conquistar o tricampeonato nacional. Considerado um dos maiores atacantes da história, Batistuta já foi lembrado aqui no blog.

Com Batistuta, a Roma ganhou enorme poder de fogo no ataque
Com Batistuta, a Roma ganhou enorme poder de fogo no ataque

Montella: goleador nato e com excelente senso de colocação, o “L´Aeroplanino” voou, literalmente, em seus tempos de Roma. Com faro artilheiro, Montella foi decisivo para o título de 2001 e brilhou na capital entre 1999 e 2007. É o quinto maior artilheiro da história do clube com 103 gols marcados.

Delvecchio: foi outro que teve destaque mesmo com o rodízio promovido por Capello. Jogando como ponta de lança ou extremo esquerdo, Delvecchio fez grandes partidas, marcou gols importantes e foi um ótimo pivô para os gols dos companheiros.

Nakata: o japonês ficou apenas uma temporada na Roma, mas foi o bastante para se tornar o talismã do time no empate heroico contra a Juventus, na reta final do Scudetto de 2001, quando marcou um gol e participou de outro. Após o título, jogou em outras equipes do Calcio e se aposentou no futebol inglês, em 2006, como um dos mais talentosos jogadores da história do futebol asiático.

Fabio Capello (Técnico): vencedor como poucos e talentoso ao extremo, Fabio Capello soube extrair o máximo de um elenco equilibrado e competitivo e montou uma Roma aguerrida, goleadora e muito talentosa. Saindo um pouco do defensivismo tão clássico na Itália, o treinador não hesitou em colocar praticamente três homens na frente, além de dois laterais ofensivos. Com pulso firme nos momentos delicados e de pressão, venceu o quinto Scudetto de sua carreira com a loba.

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