
Tony Pulis e o “famoso” Luton Town
Julho chegou! E a imprensa sem muita notícia começa a bombardear a mente do fã de futebol com rumores de transfêrencias e curiosidades sobre jogadores. Pogba vai para o United? Götze volta para o Borussia? Como será abriga na Premier League entre Mourinho e Guardiola? Com tanta informação os fãs ficam só tentando desvendar os mistérios da próxima temporada. Em algum site em que você pode montar seu time, você tentar mudar posições de jogadores e ver quais as possibilidades de usá-los em outros esquemas táticos. Coloca um ponta na meia, meia de centroavante . Quando termina suas idéias continua olhando a página e vê uma notícia falando de um time de um técnico chamado Tony Pulis(Luton Towns) e que ele acabou de contratar um atacante da segunda divisão. Dada a semi-inutilidade da notícia, você movimenta os olhos e paira o olhar sobre um anúncio de comida japonesa. Percebendo sua antes imperceptível fome, você larga o computador e vai para a cozinha na esperança de saciá-la.
Enfim, a temporada começa. Você se empolga com o início semi-brilhante do Arsenal. Aquele futebol alegre, vistoso, tático e sufocante te encanta. Você pensa: “Nossa, esse ano eles saem da fila. Não há um time que está melhor que eles”. Lá pela sexta rodada, com o campeonato extremamente embolado, figurinhas carimbadas começam a se destacar. É Kane pra lá, Özil pra cá, Carroll aqui, Defoe acolá. Uma ou outra promessa surge oriunda da base de um time no G-4, alguma contratação que causou certo rebuliço no mercado fica mais no banco do que em campo, o Sunderland namora a zona de rebaixamento. Até aí, nada de diferente. Mais uma temporada inglesa começa e as coisas parecem seguir seus cursos naturais.
De repente, ao fuçar na internet, você vê a notícia: “Luton Town, o time de Tony Pulis, arranca empate contra o Chelsea em Stamford Bridge”. Surpreso com o fato, você dá um pulinho na cadeira e fala: “Nossa”. Abre o link e começa a ler. No corpo da matéria, as palavras “retranca”, “contra-ataque” e “chutão” se repetem num loop infinito de kick-and-rush. Ao final, você lê que o Luton Town está na décima-segunda posição do Inglesão, enquanto o Chelsea está em terceiro, atrás do líder Arsenal e do Manchester United.
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Passam dias, semanas, meses. O Arsenal joga tão bonito quanto a garota de seus sonhos. Uns três jogadores se machucaram, porém Arsène Wenger conseguiu acertar o time. O United segue na cola. O Tottenham ganha corpo na disputa. O Chelsea segue logo atrás. Manchester City vence muitos jogos. Liverpool, Everton, West Ham, Southampton, Newcastle, todos eles vêm em seguida. Você se empolga e pensa consigo mesmo: “Quão sensacional é poder acompanhar esse campeonato maravilhoso ao vivo”. Eventualmente, você lê notícias do tipo: “Sunderland empata com Aston Villa em casa” ou “Stoke goleia o Leicester”. No entanto, você percebe que as palavras “Luton Town vence mais uma por um a zero” foram lidas algumas vezes nesse período. Após ficar sabendo que o tal Luton Town, comandado por Tony Pulis, venceu o Norwich fora de casa por dois a um, você decide ver qual é a desse time.
É sábado, oito da manhã. A ressaca da noite de sexta o ataca com uma pressão digna das equipes de Marcelo Bielsa. O Luton enfrentará o Watford, dentro de casa. Você pensa que deve ser uma das trinta e duas pessoas no Brasil vendo essa pelada, mas persevera na frente da televisão. Ora, como joga esse time que, mesmo você tendo visto que venceu inúmeras partidas, se encontra na décima-primeira colocação?
Rola a bola. Passe pra cá, chutão pra lá, você se lembra de seu pai falando que “inglês não sabe jogar bola, é tudo cintura dura, só dá bicuda e sai correndo”. Percebe que, pelo menos, 90% do Luton Town tem mais de 1,87 de altura. Ouve o narrador falando que “as equipes de Tony Pulis nunca terminaram o campeonato inglês fora do intervalo entre a décima-primeira e a décima-quarta colocação” (isso é um fato interessantíssimo que você teve o trabalho de pesquisar após o jogo, e, surpreendentemente, é verdade). Você vê o Watford tentando criar alguma coisa, colocar a bola no chão, buscar triangulações. Porém, o incansável ferrolho defensivo do Luton Town é muito para o adversário. No entanto, a chatice do jogo o contagia. A falta de oportunidades de gols para ambos os lados o penetra. O sono, enfim, o atinge.
Ao acordar, você percebe que o jogo acabou. A mesa-redonda na televisão acusa o fato. Ao procurar na internet, você lê: “Luton Town vence Watford por um a zero, com gol de cabeça do centroavante do time aos trinta e dois do segundo tempo”. Irritado com a excessiva feiura da equipe, você se promete: nunca mais irá ver um jogo de uma equipe de Tony Pulis na vida.
Porém, duas rodadas depois, o Luton enfrenta o Arsenal. Você, apaixonado pelo belíssimo estilo de jogo dos gunners, obviamente, quer assistir o jogo. Ignora o fato do chatíssimo time retranqueiro estar em campo, afinal, o futebol mais bonito da Inglaterra vai dar mais um show. No entanto, ao assistir a partida, você percebe que nem as mais belas linhas-de-passe do time londrino conseguem passar pelas altas linhas do Luton Town. Tudo que o volante tenta dá errado. O lateral tenta subir, mas é impedido pelo ponta-direita. Lançam a bola para o centroavante, mas os altíssimos zagueiros da equipe afastam de cabeça. No final, mais um zero a zero chato na conta do Luton (que ainda está na décima-primeira colocação).
![]() Passam mais meses. A janela de janeiro veio, nenhuma equipe contratou ninguém de verdade (com exceção do Luton, que trouxe um volante veterano consagrado de uma equipe mediana). O Arsenal já foi eliminado da Champions League. Nas oitavas, perdeu para o Barcelona. Amargando a terceira colocação da Premier League, parece que já não tem a alegria de jogar bola de outrora. Manchester United lidera. Chelsea em seguida. O Luton Town está na décima-terceira colocação. Parece que perdeu uns jogos contra o Stoke ou contra o Newcastle, mas ninguém sabe ao certo. Eventualmente, você assiste alguns jogos da equipe contra os grandes, mas nunca é legal. As partidas são sempre retrancadas, sonolentas e sempre acabam num um a zero irritante e esquecível ou num igualmente chato zero a zero. Tony Pulis parece neutralizar qualquer ação divertida do jogo. |
Um dia, você lê que o Luton venceu o Norwich por dois a zero. Fica assustado ao ler que é a maior diferença de gols que a equipe de Tony Pulis conseguiu aplicar sobre outro time. Pensa que o treinador se contenta somente com vitorias de um a zero ou empates fora de casa.
No entanto, você está errado. Tony Pulis não quer vencer por pouco ou ficar naquela zona entre o onze e o catorze. Sua missão é sempre livrar a equipe do rebaixamento. E, quiseram os deuses da bola que assim fosse, Tony Pulis não rima com a degola. Ao filosofar um pouco, você entende: o melhor remédio para equipes medianas é jogar um futebol mediano. E Tony Pulis é quase pós-doutorando em futebol mediano. Chutão, retranca e cabeceios. E assim a vida segue. E Pulis continua invicto em sua luta rumo à permanência.