Torino e Man. United se reergueram, a Chape também consegue!

Depois da dor, não importando o tamanho, o amanhã sempre chega. Para a Chapecoense, que acaba de viver a maior tragédia da história do futebol brasileiro, o dia seguinte parece incerto. A angústia e as saudades falam mais alto. Porém, o ir adiante é obrigatório, e foi assim também com os italianos do Torino e os ingleses do Manchester United, para citar dois exemplos de clubes que passaram por tragédias parecidas.

Vamos relembrar abaixo como foi o ‘dia seguinte’ dessas duas equipes e como os clubes fizeram para superar a dor imensa pelo ocorrido.

TORINO – 04/05/1949

Tetracampeão italiano, o Torino caminhava para conquistar o quinto título consecutivo quando perdeu 18 jogadores em um acidente aéreo nos arredores de Turim, no norte da Itália, em 4 de maio de 1949. No total, foram 31 vítimas, sem sobreviventes.

Foi a primeira tragédia de avião da história do esporte e deixou cicatrizes até os dias de hoje, sendo que o clube jamais retomou a grandeza daquela época.

A Itália estava vivendo a dureza dos anos do pós-guerra, com muita miséria e desemprego. Não havia alimento para todos. Muitos deixavam o país para tentar melhorar de vida. O Torino destoava nesse cenário. Com jogadores famosos e fortes, base da seleção italiana, a equipe empilhava taças desde antes do início da guerra. Em 4 de maio de 1949, o time retornava de Lisboa onde havia participado de um jogo festivo com o Benfica. Enganado por uma falha no altímetro, o piloto julgava estar numa altitude maior do que a real. O engano fez a aeronave chocar-se com um dos muros da Basílica de Superga, no alto da colina de mesmo nome, já na parte final da viagem de volta. Faltavam quatro rodadas para a conclusão do campeonato de 1948/49 quando ocorreu o acidente fatal.

O que sobrou do avião que levava o time do Torino em 1949.

Os que testemunharam o acidente recordam apenas do forte estondro ouvido na cidade. Deixaram registrado na história o temor de que fosse uma bomba caindo na cidade, como ocorrera nos anos da guerra. Na verdade, era uma outra tragédia. O fato ocorreu por volta das 17h05. A notícia começou a circular e muitos não conseguiam crer. Aquilo entristeceu todo o país. No funeral, 700 mil pessoas choraram a morte daqueles jogadores, que fizeram aquele Torino ficar eternizado na história como o Grande Torino.

Além de decretar luto oficial, a federação italiana (com aprovação dos demais clubes) nomeou o Torino campeão antecipadamente. Ainda assim a equipe grená decidiu terminar a competição e entrou em campo nas quatro partidas finais com uma escalação formada pelos juniores. Em respeito, os adversários fizeram o mesmo. Foram quatro triunfos: Genoa (4×0), Palermo (3×0), Sampdoria (3×2) e Fiorentina (2×0).

A notícia chocou e mexeu com o mundo. O River Plate, também base da Argentina, teve um gesto de solidariedade após a tragédia. Viajou para Turim e disputou um amistoso contra uma seleção do Campeonato Italiano, batizada como Símbolo do Torino. O empate por 2 a 2 pouco importou. A exibição de craques como Di Stéfano, Labruna e Lostau tinha como objetivo lotar o estádio Comunale (hoje, totalmente reformulado e chamado de Olímpico Grande Torino) para doar a renda para os familiares dos mortos.

No Brasil, o Corinthians jogou um amistoso com a Portuguesa com a mesma camisa do Torino, no Pacaembu, e doou a renda aos familiares dos jogadores. Assim como Palmeiras, Portuguesa e São Paulo, o clube ainda celebrou uma missa para os italianos.

O gesto amigo de outros clubes e o quinto título consecutivo não foram capazes de aliviar a dor. Tanto que no ano seguinte a equipe nem sequer estampou o Scudetto na camisa, algo inédito desde que a medida foi adotada em 1925. Havia uma grande depredação no clube.

Jogadores que não viajaram por estarem lesionados, como o lateral Sauro Tomà e goleiro reserva Renato Gandolfi, escaparam da morte. Para eles, a tristeza nunca foi curada. Tomà, que hoje tem 90 anos, sempre diz que morrerá duas vezes. “Uma com a tragédia e a outra quando minha vida chegar ao fim”. Ele mesmo deixou o Torino em 1951, traumatizado.

Time do Torino de 1949

Sandro Mazzola, filho do craque Valentino Mazzola, camisa 10 do Torino e da seleção, e esperança de um futuro no clube de Turim não conseguiu ingressar na base da equipe tamanho o trauma que ficou. Começou a carreira na Inter de Milão, pela qual foi campeão europeu e mundial. O irmão Ferruccio Mazzola seguiu o mesmo caminho.

Ferrucio Novo, o presidente que montou o famoso esquadrão granata, tentou nos primeiros anos resgatar a equipe, mas não conseguiu. Abalado, deixou a presidência em 1953. Era difícil encontrar alguém que quisesse assumir o clube naquele período.

De 1953 a 1955, foi formado um comitê para dirigir o clube. O mesmo ocorreu em 1956/57, quando até mesmo o argentino Antonio Liberti (o mesmo que dá nome ao estádio do River Plate) aceitou presidir o clube italiano para tentar ajudar. Mas a situação era difícil.Este anúncio encerra em 45 segundos.

Os times geralmente eram formados por juniores, que sentiam o peso de honrar uma equipe imortal. Mesmo quem chegava contratava acabava envolvido na depressão que rondava o Torino. Além disso, com pouco dinheiro dos proprietários, a equipe passou a fazer cada vez mais campanhas piores, sem qualquer protagonismo. Tamanho declínio levou trouxe o primeiro rebaixamento em 1958/59, dez anos após a tragédia.

Sessenta e sete anos após a tragédia, o Torino conquistou apenas um Scudetto (1975/76) e disputou a segunda divisão 12 vezes. O vice-campeonato do Italiano em 1976/77 e em 1984/85, o vice da Copa Uefa em 1991/92, além da taça da Copa Itália em 1992/93, são as melhores lembranças dos últimos anos.

Desde o acidente, todos os anos o time repete um ritual. A delegação granata se dirige até a Basílica de Superga, onde uma missa é feita em homenagem ao time de 1949. Depois, do lado de fora do templo, próximo ao muro onde o avião se chocou, o capitão da equipe lê os nomes dos jogadores mortos diante de um monumento que foi erguido no local.

MANCHESTER UNITED – 6/2/1958

Comandado pelo lendário técnico Matt Busby, o Manchester United, campeão inglês em 1956/57, contava com uma de suas maiores gerações da história. Porém, em 6 de fevereiro de 1958, uma tragédia abreviou a chance de aquela equipe aumentar seus feitos.

O avião da British European Airways com 44 passageiros saiu de Belgrado (antiga Iugoslávia) com destino a Manchester, com parada em Munique. O United havia feito um jogo da Copa da Europa (atual Uefa Champions League) contra o Estrela Vermelha, conquistado a classificação à semifinal, e no voo de volta para a Inglaterra estavam a delegação, jornalistas e torcedores.

Após parar na cidade alemã para reabastecimento, o piloto fez duas tentativas de seguir viagem, mas o mau tempo o impediu. Na terceira, porém, a lama que se acumulou na pista fez com que o avião não levantasse voo, e ele se chocou com uma casa, causando a morte de 23 pessoas, sendo oito jogadores e três membros da comissão técnica do United.

Sir Bobby Charlton foi um dos sobreviventes daquela terrível tragédia. Roger Byrne, Mark Jones, Eddie Colman, Tommy Taylor, Liam Whelan, David Pegg, Geoff Bent morreram no acidente. Duncan Edwards morreria 15 dias mais tarde.

Time titula do Manchester United em 1958

Além do abalo psicológico e da perda de parte de seus atletas, o United – que seria eliminado na semifinal da Copa da Europa (Uefa Champions League antigamente) para o Milan e viu o sonho de levantar a taça pela primeira vez chegar ao fim – teve de lidar com o impacto em suas finanças.

Foi aí que entrou o Real Madrid, como contou o historiador John Ludden em seu livro “A Tale of Two Cities: Manchester and Madrid 1957-1968” (“Um conto de duas cidades: Manchester-Madrid 1957-1968“, em português).

Os espanhóis ofereceram a taça da Copa da Europa, que conquistaram ao bater o Milan na decisão, ao clube inglês, mas o presente foi recusado. Além disso, o astro Alfredo di Stéfano poderia ter ido jogar em solo britânico na temporada 1958-59 para ajudar na recuperação dos Red Devills.

“[O presidente do Real, Santiago] Bernabéu foi ver isso. Ele queria ir até o final da temporada, com o United pagando metade de seu salário e o Real Madrid pagando a outra. Mas a Federação Inglesa bloqueou pelo fato de que ele tomaria o lugar de um

A ajuda dos espanhóis, então, veio de outra forma, como apontou o Independent. Amistosos para arrecadação de dinheiro para os ingleses foram disputados nos anos seguintes à tragédia, assim como um memorial foi criado pelo Real em homenagem às vítimas. Além disso, o clube madrilenho colocava sua estrutura à disposição do United para a recuperação de jogadores, sem custos.

De acordo com o site inglês, o Real Madrid cobrava 12 mil libras para estas partidas, mas o presidente Bernabéu, que viria a batizar o atual estádio do clube espanhol, disse aos Red Devills para “pagarem o que podiam.”

Diferente do que ocorreu com o Torino, a Federação Inglesa não nomeou o Manchester United campeão no país. Mas o apoio que o clube recebeu o ajudou a se reerguer.

Os Red Devills ganharam a Copa da Inglaterra em 1963, cinco anos depois da tragédia. Em 1965, veio a taça do Campeonato Inglês; três anos depois, em 1968 (dez anos após a tragédia) a tão sonhada Copa da Europa, e com direito a vitória sobre o Real Madrid na semifinal. Na final, o triunfo foi contra o Benfica, que tinha Eusébio, Coluna e Simões.

Detalhe é que o capitão do time que alcançou o topo da Europa era Bobby Charlton.

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